Costumo mentir quando me perguntam coisas muito pessoais das quais não se a resposta. Também quando não entendo a pergunta, quando a pergunta está numa espécie de beirada onde o significado das palavras não é só o que está no dicionário ou em qualquer outro manual. Como por exemplo quando me pergutam se eu já amei. A resposta me parece impossível ainda que a mais natural seja: Sim, já.
Mas nenhum dos amores que já senti, mesmo as paixões, nenhum deles foi semelhante ao outro. E não é possível descrever a diferença. Tampouco é possível entender essa diferença, mas há todo um léxico dentro dessas palavras como amor, paixão, felicidade, ciúme… do qual não temos acesso. Anne Carson em Variations on the Right to Remain Silent nos conta de uma palavra que escapa da língua dos deuses para o texto de Homero. MOLY. Não há tradução para a palavra, sabemos que é uma planta por conta da Odisséia, o resto nos falta.
Tenho essa sensação em falar de amor. Há uma ideia do que é, mas é como se algo que não é de nossa língua escapou e está entre nós. Sei o que é amor mas não posso ir para o meio da cidade e apontar isso é amor da mesma forma que não posso ir até uma ilha da Grécia Antiga e apontar isso é MOLY. Preciso que me digam.
Essa falta de capacidade de conseguir saber do que falamos quando falamos amor não é uma forma de desacreditar nele. É uma forma de, talvez, louvá-lo demais. Consigo dizer o que não é amor para mim, consigo desenhar uma silhueta por meio da negação, focando nas sombras e deixando que as luzes apareçam naturalmente. Vou apagando as luzes e deixo reluzir o que é o amor, como num desenho muito escuro, com poucas luzes.
Quando, há pouco, estive no casamento de minha prima não conseguia parar de chorar. Há um milagre ainda nesses rituais. Há um naco de luz no que insistimos em repetir por gerações. E repetimos o amor, tentamos repetir as formas de amar. Tentamos dar forma a esse Deus que é o Amor mas podemos apenas olhar esse naco de luz refletido em alguma superfície, geralmente um corpo. Mas não podemos olhá-lo diretamente. Não sabemos dizer quando encontramos um solo fértil para plantar o Amor ou MOLY, precisamos de um salto em direção a fé para chegarmos nesses lugares onde as palavras se silenciam. Se recusam a fazer seu trabalho, e funcionam apenas como um borrão onde cada um pode ver o que precisa.